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Die Nummer

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Manchmal vergesse ich wer bin ich, dann nehme ich ein Wörterbuch.
Ich blättere durch die Seiten, so als würden meine Hände einen Männerkörper berühren, sehe ich die Worte ganz langsam und wie einen Zaubertrank trinke ich die Wörter und ich finde mich wieder.
Ich weiss immer noch nicht genau, wer ich bin, aber jetzt habe ich alles, um mich zu beschreiben.

“É menino ou menina? É surpresa.”

gravidez

 

Minha irmã está grávida, entrado quase no sexto mês. Ela e seu companheiro sabem o sexo do bebê, mas não querem divulgar sob a justificativa de que não querem condicionar roupas, presentes e falam à ideia de que existem coisas que são para meninos e coisas outras que são para meninas, porque assim como eu, eles acreditam que isso não existe e mais ainda que isso não é relevante para um bebê.

Então começou a maratona. Toda vez que entro em uma loja de roupas de criança, a primeira pergunta que pula da boca da vendedora – engraçado, nunca fui atendida por um homem – é: É menino ou menina? Tal pergunta inclusive foi me feita quando entrei para comprar fraldas de pano. Existe alguma diferença? Algumas vezes eu dizia que não sabia qual era o sexo e cores neutras me eram apresentadas. Outras vezes me diziam categoricamente que não existia nada neutro,nos dando as costas. Houve ainda momentos em que ao olhar para uma peça rosa ou azul a vendedora me aconselhou a levar quem sabe um verde, já que eu não sabia qual o sexo da criança. Em outros momentos, as vendedoras me perguntavam: mas tem certeza que a mãe da criança vai usar rosa se nascer um menino?

Passando da fase das vendedoras, vamos ao comentários dos amigos, parentes e derente, porque né, todo mundo se sente na obrigação de comentar as escolhas alheias. Respeito pra quê ?

– Você pintaria uma parede de rosa se tivesse um menino?
-Lógico. Porque não?

– Mas gente (disse eu) roupa rosa não vai “enviadar” a criança não (como se isso fosse um problema).
– Mas vai saber, né? Porque as cores influenciam sim.

– Essa atitude de não dizer o sexo é muito torturante, porque isso diminui as possibilidades. (Oi? Desde quando não dividir diminuir as possibilidades?). A pessoa não pode nem comprar um mobile, porque tem tantos mobiles bonitos feito para meninas e tantos mobiles bonitos feito para meninos e você não vai poder comprar nenhum.

Até quando vamos achar que cores influenciam, que existem coisas feitas só para meninos e coisas só para meninas? Até quando vamos achar que isso é somente uma questão de cor e não de papéis que são atribuídos ou retirados de nós enquanto seres humanos?

Esses dias estava numa feira de livros, e esse foi o caso mais bizarro que já vi nessa separação entre meninos e meninas, e vi dois exemplares de bíblias infantis: um com histórias bíblicas para meninos e outro intitulado históricas bíblicas para meninas. Até aí, pensei mesmo sem concordar, que talvez um livro falasse de Esther, por exemplo e o outro sobre Davi. Lógico que o livro para as meninas era rosa e o azul para o meninos. Então folhei página por página de cada livro e fiquei abismada ao ver que era exatamente as mesmas histórias, palavras e desenhos nos dois livros, salvo o fundo rosa em cada página em um livro e o fundo azul no outro. Gente…O que é isso é?

O que vejo ainda é que meninas podem usar azul, desde que seja um vestido, mas meninos não podem usar rosa. Em umas das conversas alguém me disse que era importante as cores para identificar  um menino ou uma menina. Mas para quê? Os meninos precisam de uma identificação prévia para fazer exame de próstata e as meninas para marcar o ginecologista? Ou uma identificação prévia funciona para elogiar as princesas e dizer que homem não chora?

Fico feliz em ter em minha família alguém que se propõe à uma outra postura e educação com relação aos papéis de homens e mulheres no mundo. Já que a educação é uma das mais impactantes formas de revolução, acho que minha irmã e meu cunhado escolheram um bom caminho. Espero que meuinha sobrinhoa possa seguir esses passos com coragem diária para construir novos e próprios caminhos livres de tais preconceitos.

 

Salvem a professorinha. Os alunos também.

Aquele silêncio poderia lembrar um velório, mas velórios vez ou outra tem piadas. O silêncio nunca existe, ou é rasgado pelas lágrimas ou pelas falas ou ainda os sorrisos. É silêncio e é medo também. Os olhos ou se estacionam para baixo, nas mesas, procurando algo que preencha aquele vazio ou estão rodopiando, às vezes atentos no que é dito, às vezes buscando algum rosto ou expressão interessante. Quanto as mentes, nada se pode dizer sobre os pensamentos que dançam independente da música tocada.

Invejo àqueles que numa roda de conversa lembram e elencam professores que marcaram suas vidas. Professores que transformaram o saber e o momento da aula com a mágica mais propulsora da vida.

Para não ser injusta eu tive uma professora e uma professor que além de suas matérias – português e matemática – ensinaram sobre a vida. Lembro que aos 10 anos em uma das aulas da professora Verônica, o assunto surgiu de alguma forma que estava eu dizendo que não achava nada ruim Eva ter mordido a maça. Dizia que graças à ela podíamos saber o que era bem e o mal. Lógico que os olhares dos colegas eram inquisidores, mas a professora ficou contente com o mero desenvolver da minha ideia.

Já Roberto, professor de matemática no ensino médio, me mostrou a lógica das coisas, ou pelo menos a sua história. Em quanto muitos reclamavam qual a utilidade em saber logarítmos, ele mostrava como a trigonometria foi impulsionada principalmente pelos estudos na/da medicina. Como sempre dizia, a matemática e todas as outras formas de saber estão no nosso cotidiano. A chave é ter sensibilidade para captar isso.

Quero ainda dizer que ter professores inspiradores não tem muito a ver com notas. Não tive as melhores notas em matemática, quando fui aluna do Roberto, mas ficava feliz em saber que cada 6 que eu tirava, era mérito dos esforços em sala de aula e não simples fórmulas ou macetes decorados. Aprendi nessa matéria que saber vai além de notas e que a vida não checará meu boletim.

Na universidade, infelizmente, não encontrei inspirações. Muitas aulas chatas, decorebas de autores, repetições de conclusões e zeros pelo livre pensamento -mesmo que embasado em certa lógica. No mestrado, nada diferente.

O primeiro parágrafo não descreve um velório, mas sim uma aula. Mas pensando bem, aquele foi o velório do sabor do saber, do cheiro dos clicks e da cor da construção. Se tudo hoje em dia é desconstrução, estou esperando que um novo tempo de inspirações seja posto, e já que o conhecimento tem mais a ver com a imaginação, como disse Einstein, como produzir imagens em ação?

Meus contos de réis.

As pessoas querem ficar ricas, mas acho que ser rico não tem muito a ver com a quantidade de dinheiro que você ganha mensalmente mas sim com a quantidade que mensalmente você gasta.

Nunca será rico se você compra um monte de frutas, porque é saudável, mas jogará metade fora porque apodreceu. Não se é rico, ou esperto, encher a dispensa de promoções se provavelmente elas passarão da validade ou ficarão estragadas antes mesmo da próxima mega-super promoção.

É riqueza ter um carro que te trará uma série de doenças nervosas e cardiovasculares? Tudo bem, provavelmente você terá dinheiro para pagar os últimos tratamentos dessa doença, mas nada pode amenizar o seu sofrimento, e da sua família esperando que seu quadro evolua ou não, porque melhora de saúde é uma coisa que no fundo, no fundo, ninguém pode comprar.

Gastar tudo quanto você recebe não significa que você controla seu dinheiro, mas significa uma escravidão em que você precisa do trabalho e não o trabalho de você. Semana passada, andando de ônibus, vi uma placa que dizia sobre a ilusão do trabalhador em achar que ele recebe dinheiro pelo seu trabalho quando na verdade é ele que paga para trabalhar. E não paga somente com dinheiro – por exemplo para ser voluntário social em outro país, mas pagamos com nossos sonhos, dores, com o tempo que poderíamos estar com nossos familiares ou conosco aproveitando a vida.

Não gosto da ideia de trabalho. Trabalho é sofrimento, é dor, é perda. Essa ideia de que trabalho é antes de tudo ganhar dinheiro me desespera. Preciso de dinheiro? Lógico que sim. Preciso comer, usar roupas e preciso juntar dinheiro para viajar e principalmente ter um consolo na velhice e suas doenças. Esse é meu único medo, agonizar doente por não ter nenhum centavo no bolso.

Estou desempregada no momento, embora esteja procurando trabalho, procurando um espaço para fazer o que eu gosto e ganhar algo digno. Talvez por isso seja tão difícil achar algo, já que procuro duas coisas tão raras hoje em dia, o prazer no que se faz e dignidade no que se ganha. Esses dias ouvi no ônibus que está cada vez mais difícil trabalhar honestamente. Para além disso, eu diria que está cada vez mais difícil viver honestamente.

Graças à Deus tenho uma mãe bondosa que provém minhas necessidades básicas e com isso me ensina que o ser é muito mais do que o ter. Não sei explicar mas “não ter dinheiro” me torna mais sensível às necessidades alheias, a ser uma pessoa mais compreensiva ao contrário de ter raiva da situação – embora muitas vezes já tenha agido dessa forma.

Acho que escrevo esse texto porque tenho pensado muito sobre a razão da vida, e não cheguei em conclusão alguma. Por outro lado, como num exercício de exclusão, tenho pensado sobre o que não é o centro da nossa razão de viver, ou não deveria ser. São tempos muitos difíceis e toda vez que assisto um jornal na televisão, as desgraças alheias, de perto e de longe, embaçam meus olhos e já nem posso ver o futuro dos sonhos.

Davi Kopenawa Yanomani certa vez disse que nós, homens brancos, não sabemos sonhar e por isso destruímos tudo que temos à nossa frente. Talvez seja o não sonhar que tenha nos amargado e nos feito tão imediatistas. Existe algo mais instável e volúvel que dinheiro? Minha mãe sempre diz: “dinheiro é uma merda, trocou já era.” Que possamos tentar o exercício de trocar dinheiro por sonhos, mas nunca sonhos por dinheiro. Ou manter conosco nossa dignidade.

Feito aqui visto lá

Oi.

 

Recentemente escrevi um texto sobre cabelos cacheados e transição capilar.

Quem quiser dá uma conferida o texto está aqui.

As relações de parentesco e o meu “etnocentrismo”.

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As relações de parentesco são um importante tema de estudo dentro da antropologia. Sejam as sanguíneas ou de afinidade, muito de debruçou nessas relações – que o diga Lévi-Strauss, em busca das outras relações com as sociedades e suas “estruturas” de funcionamento, de trocas, de aliança políticas, traços religiosos e etc. Há todo um arsenal de teorias e exemplos de etnografias clássicas sem contar os infindáveis gráficos e rabiscos tentando deixar essa constituição o mais claro possível para nós meros ocidentais entendermos. Digo ocidentais, porque caso não esteja enganada, os estudos das relações de parentesco foram feitos em comunidades indígenas ou como muitos antropólogos chamavam, primitivas, embora possamos observar esse “sistema” em vários grupos.

O termo primitivo, no sentido de inferior e não no sentido de primeiro, é uma das categorias conceitual que foi criada no calor das posturas eurocêntricas, achando que a Europa era a mais bonitinha e desenvolvida do pedaço. O que não era Europa não era científico, lógico, evoluído.

E assim temos outro conceito, o etnocentrismo, quando não mais a Europa é o centro, mas “eu” bem melhor que o “outro”. Assim sendo os povos eram primitivos por uma questão eurocêntrica e as relações parentescas em Ilhéus eram pessímas por causa do meu etnocentrismo. Como assim? Deixe-me (des)enrolar um pouco.

Em Ilhéus, uma cidade no sul da Bahia, com aproximadamente 170 mil habitantes, onde morei por 18 anos, o cacau moveu a economia local por muitos anos até seu declínio. A economia declinou, o dinheiro de muitas famílias acabou mas o poder do sobrenome dos fazendeiros de cacau sobrevive firme e forte até hoje.

Em geral, depois de alguns segundos de conversa com algum estranho, rapidamente surge o questionamento: de quem você é filho?, como uma evidência clara da busca pelas ligações familiares, as relações de parentesco.

Assim como dito no primeiro parágrafo, essas relações reconhecidas pelos sobrenomes ainda negocia em Ilhéus pessoas, status social, postos de trabalhos e quiçá vínculos religiosos. Eu sempre achei péssimo isso de perguntar de quem eu era filha. Primeiro porque sempre achei que sou uma pessoa dotada de agência independente de quem eu seja prole, segundo que meu sobrenome paterno – o mais procurado nesses casos – não era da região, então aí mesmo que ninguém me conhecia e terceiro porque não tendo um sobrenome reconhecido nessas relações eu tinha poucas chances de muitas coisas: desde fazer amizades até conseguir trabalhos.

E aí entramos no conceito do etnocentrismo. Eu achava que isso era inviável. Como uma cidade pode sobreviver com essa ideia de atrelar o sobrenome das pessoas às suas conquistas pessoas e profissionais?? Contudo, mesmo que “eu” ache isso errado e que isso prejudicasse e prejudique pessoas, e que eu seja contra o fato das pessoas serem valorizadas por uma questão de status social, tenho que admitir que essas relações de parentesco são muito importantes, forte e presentes na dinâmica social ilheense. É ela que ainda possibilita uma série de trocas, que faz e desfaz alianças políticas, econômicas e sociais.

Lógico que algumas coisas poderiam mudar, mas acredito que isso não deve ser imposto, numa clara metodologia colonial, mas que a dinâmica social e seus agentes podem ir mudando alguns contextos ou exigências nessas relações, que como dito acima não são apenas consanguíneas mais também por afinidades. Acredito ainda que tal situação já vem apresentando mudanças significativas.

Vale ressaltar que não é que as pessoas e grupos “evoluem”, mas que elas vão respondendo às suas demandas de formas diferentes, em tempos diferentes. Não sei até que ponto vai esse meu entendimento em relação a essa situação ilheense, mas certamente estou fazendo o exercício de respeito e diálogo dos mundos que me cercam.

Vermelho

vermelhocor da minha personalidade
unhas
fertilidade
nossa música e amizade
seus lábios
a face da indignação
a lua
os pés do agricultor
a rosa. de luxemburgo
a redenção.na cruz
os olhos desesperados
utopia.ideologia
2% dos cabelos humanos
marcante.impactante
amor.dor.aminésia
que mais mesmo?

Você cortou o cabelo? Não. Eu doei.

Dias atrás fiquei sabendo de um projeto de duas meninas que estão aceitando doação de cabelo para a confecção de peruca para pacientes em tratamento contra o câncer. Quando soube, até compartilhei no meu facebook a ideia, para incentivar outras pessoas.

Semana passada fui ao salão – participar de um concurso de cabelos cacheados –  e a minha irmã marcou um horário para doar seus cabelos. A Taís tem o cabelo bem curto, e como ela não tem apego nenhum ao cabelo, não se importou em ficar “joãozinho”.

Em casa eu fui procurar pelo projeto e acabei ficando muito feliz com os depoimentos que eu li. Como o projeto pede no mínimo 10cm de cabelo, eu sabia que eu poderia doar os meus também. Mas eu nunca tinha cortado o cabelo tão curto e fiquei um tanto quanto ansiosa.

Confesso que esse “desconhecido momento capilar” me fez balançar nas bases, mas eu sempre pensava: não é por mim, não é pelo visual e sim por eles. Pensei que se para mim, que sei que amanhã o cabelo já estará novamente em processo de crescimento, o cabelo é tão importante imagine para essas pessoas que por um motivo tão triste passam por essa transformação.

Decidi e marquei um horário para doar meus cabelos. A cabeleireira ficou surpresa que eu e minha irmã íamos doar, mesmo com os cabelos pequenos. Eu decidi que durante o corte eu não iria ver. Só queria ver o resultado final. Eu ainda não estava totalmente preparada e não queria que isso atrapalhasse no corte. Ao fechar os olhos eu mentalizava muito amor, para que a pessoa que recebesse meu cabelo tivesse um pouco de alegria consigo além dos cachinhos.

Mesmo doando algumas mechas, achamos que minha doação pode até fazer uma peruca inteira! Que felicidade a minha! Foi muito legal participar dessa doação.

E daqui a pouco quanto ele crescer, se eu puder, doarei novamente 🙂

Se você quer ajudar, aqui está o link para saber mais sobre o projeto Cabelegria.

 

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Arbeit macht (nicht) Frei. *

Muito antes das aulas de História Econômica na faculdade de História, meu pai já me dizia que “chegaria o tempo em que o homem não se deixaria ser explorado pelo próprio homem”. Meu pai também me ensinou que falar com o governador do estado de São Paulo – cliente dele – era igual a conversar com o seu Jaime, dono do bar perto de casa, e me mostrou que é importante valorizar seu próprio trabalho e sua profissão; seja valorização financeira, seja valorizar o quão bom você é no serviço que faz.

Hoje, de maneira mais clara, vejo que meu pai me passou muito sobre relações de trabalho, relação patrão e empregado e acima de tudo sobre justiça.

Depois que terminei o mestrado e voltei da Alemanha, comecei a procurar trabalho; passei por um cozinha suja e sem estrutura, onde o chão dava choque por conta de uma rede elétrica mal feita, passei por uma confeitaria onde os clientes eram tratados como se eles não tivessem autonomia e onde os donos mentiam para poder vender seus produtos, até chegar na cereja do bolo da exploração do assalariado.

Sabe…eu não consigo ouvir um furor em cima de jóias e esmeraldas, onde as “clientes” não sabem se levam tudo ou quase tudo, e essas mesmas pessoas fazendo caso quando um empregado pede vale para comprar gás ou pagar a parcela do dentista da filha. Ficar inertes à falas de que preto tem cara de malandro, que está envolvido com drogas ou que o Brasil é um péssimo país porque eles têm que pagar leis trabalhistas, é quase impossível.

E por causas dessas coisas, eu tenho estado em uma crise pessoal-ideológica ou seja lá que nome tem isso… Algumas pessoas me dizem: ” É Nádia…é assim mesmo, fazer o quê”. Outras dizem: “Quem sabe um dia vai melhorar” e algumas outras apostam no: “muda de emprego, vai ganhar mais”.

A questão não é essa, e você pode até me dizer: “Nádia, você não é a única que sofre com isso.” Sim, eu concordo com você. Algumas pessoas pensam nisso e acabam por achar que um dia vai mudar e continuam entregando suas vidas a esses trabalhos à la tempos modernos. Outras pessoas, como a senhora alemã que vive quase 20 anos sem dinheiro, acabam por encontrar outras formas de lidar com essa situação canibal, e acabam por sair do círculo de fogo.

Eu sei que amanhã, quando eu acordar, alguns vão continuar viajando para a Espanha, enquanto outros ficam felizes que trabalharam até as 7 horas da noite de Natal… Mas o que eu não quero é ficar fazendo parte desse sistema de produção, reprodução, alienação e exploração.Como sair? Eu ainda não sei, mas tem que haver alguma opção, alguma saída. Vou achar, vou inventar, mas vou dar um jeito. Não posso viver em meio a tudo isso e deitar minha cabeça em paz no travesseiro. O que me faz dormir não é a consciência em paz e sim o cansaço no corpo.

* Frase escrita na entrada dos campos de concentração nazistas.  “O trabalho (não) liberta”.

A escrava-liberdade feminina

Em umas dessas reuniões, um casal – ela brasileira, ele alemão – estavam contando o quão cara estão as creches em Londres, local onde moram atualmente. Ela, que tem o desejo de ser mãe, brincou que quando tivesse sua criança ia abrir uma creche para ajudar a pagar a creche da sua criança.No meio dessa conversa veio o ponto que, se ela não estivesse trabalhando poderia cuidar da criança e economizar as mensalidades da creche. Nesse momento, um amigo disse que ela não poderia pensar em não trabalhar: “Onde vão ficar todos esses anos de investimento em mestrado, intercâmbio, doutorado? Tem que trabalhar sim.”

Foi então que comentei que o importante nessa questão era que ela escolhesse o que queria fazer e não ter uma obrigação a trabalhar ou qualquer que fosse a obrigação. Creio que as discussões sobre ter espaço no campo intelectual, educacional, político, econômico e todas essas caixinhas, estão associada à uma questão de acesso e de escolha. Se a mulher é obrigada a trabalhar em que isso se diferencia da época em que ela era obrigada a ficar em casa e a cuidar dos filhos e filhas? Nenhuma. Parece ser uma velha teimosia em determinar o que nós podemos, onde, como e quando fazer.

As várias discussões no campo feminista estão focadas em uma mulher que seja dona da sua própria história e escolhas. Que a mulher possa escolher a vida que ela tem, e ser respeitada por isso; se em casa ou fora, com ou sem filhos, casada ou solteira, magra ou gorda, enfim, que ela não seja um resultado de um discurso imposto que acaba por camuflar uma liberdade que mais parece uma escravidão.